Salvador completa 470 anos cantando. Não é novidade para ninguém que a música popular do século XX ganhou alguns dos seus contornos mais interessantes na Roma Negra (e moderna) que vai de Caymmi ao Axé Music, passando por Tropicalistas, Rock’n’Raul, Novos Baianos, Blocos Afro e muito mais. Em pleno século XXI, nada mudou e tudo está diferente. Os artistas baianos surgidos nos últimos anos trouxeram consigo propostas estéticas originais e formas inteligentes de dialogar com as novas características dos mercados fonográfico e midiático, sempre refletindo sobre a Cidade da Bahia, sua herança cultural e seus desafios sociais. Os exemplos são muitos e certamente já estão pipocando na sua cabeça se você está atento ao melhor que acontece na música brasileira contemporânea. A Editora Dubas se orgulha de poder destacar em seu repertório dois grandes artistas soteropolitanos que, além de presentearem Salvador (e o Brasil) com suas obras, provam, cada um a sua maneira, que o melhor momento da música da Bahia é sempre. #Salvador470 #Salvador470Anos

 

GIOVANI CIDREIRA
Assim como a cidade em que nasceu, Giovani Cidreira é aberto a múltiplas tendências e, por isso, desafia o óbvio em suas formas de expressão. Entre 2012 e 2015, fez parte da banda Velotroz que, influenciada pela música brasileira dos anos 1970, alcançou uma sonoridade única. Lançado em 2015, o EP Giovani Cidreira, primeiro registro solo do artista, teve a música Ancohuma premiada no XII Festival de Música da Rádio Educadora FM, levando a um público maior um trabalho que já era largamente admirado na cena alternativa de Salvador. Em 2017, Giovani Cidreira lançou o seu primeiro disco solo, “Japanese Food”, e nele mostrou que, além de versátil, sua obra é profunda e intensa de maneira tal que só poderia ter surgido em um lugar como a Bahia.
As referências a Salvador passam pelas letras das canções – algumas vezes de forma bastante objetiva –, mas se desenvolvem muito além disso. Giovani se vale de diferentes gêneros musicais e elementos sonoros para transmitir suas ideias. Como resultado, suas composições provocam uma abertura simbólica e uma expansão dos sentidos para retratar o cotidiano. O “sentir” tem precedência ao “explicar”. Um dos melhores exemplos desta excelente estratégia para traduzir a cidade está em “Um Capoeira”, parceria com Paulo Diniz.
Além disso, a música de Giovani Cidreira acontece em sua própria cadência. Como James Martins lembrou em seu manifesto #DeBoaNaBahia, a proverbial (e preconceituosa) preguiça baiana é na verdade uma rejeição aos ritmos que um mundo descartável impõe: “é encarar a vida. devagarinho. com pressa de não gozar”. Ainda que Giovani não esteja para brincadeira, baianamente, sua música não tem pressa. Ela está constantemente buscando, experimentando caminhos e se divertindo com isso. Cidreira homenageia Salvador até nas características harmônicas e nos arranjos de suas canções. Camadas de som que se intercruzam, às vezes de maneira conflituosa, tomando e cedendo espaços. Um carnaval de corpos se esbarrando, se beijando e até se chocando uns nos outros, mas que, na imagem ampliada, fazem parte de uma grande festa (Movimento da Espada).

 

LUCIANO SALVADOR BAHIA
Luciano é um cronista de letra e música que honra o gênero canção como poucos hoje em dia no Brasil. Mas ele respeita as tradições, sem prestar-lhes obediência cega. Sendo assim, a coincidência do nome de batismo não poderia ser mais significativa. Salvador, a cidade da Bahia, está sempre se renovando para continuar sendo ela mesma.
A exemplo de tantos outros músicos de grande valor, Luciano começou a carreira se apresentando na noite. Além de aprimorar suas habilidades como instrumentista, este período certamente permitiu-lhe aguçar a sua percepção a respeito de personagens boêmios que povoam a cidade (A Noite de Ontem Nunca Aconteceu). Em seguida, passou a ser convidado para compor trilhas sonoras e direções musicais de espetáculos de teatro e de dança. Antes de começar a compor canções, produziu discos e tocou junto com importantes artistas baianos, como Mariene de Castro e Márcia Castro. Quando as primeiras autorias vieram, Salvador Bahia já tinha absorvido por todos os poros a arte e a musicalidade do seu lugar (que é vários). Por isso, não é exagero dizer que as canções assinadas por Luciano são dele e da Bahia inteira.
Em 2004, estreou em disco despertando a atenção de muitos pela perspicácia de suas composições, canções inteligentes capazes de construir dramas e personagens com humor e profundidade. Presente no repertório do disco intitulado “1”, a música “Queda” rendeu a Luciano o Troféu Caymmi de melhor compositor (uma chancela e tanto). Rapidamente, a canção se tornou um grande sucesso radiofônico na voz de Celso Fonseca. Com “Abstraia, Baby”, lançado pela Dubas Musica em 2014, Luciano mostrou definitivamente que não tinha só aprendido o sotaque, mas sabia falar com desenvoltura própria a língua dos grandes mestres da canção. “Nem Venha”, faixa do disco, não deixa nenhum resquício de dúvida a respeito disso. “Tango do Mal”, outra composição presente no disco, foi tema da novela global “Babilônia”, na voz de Simone Mazzer. O deboche como forma de protesto. Com Luciano, a arte de Salvador renova a sua vocação de ser, ao mesmo tempo, popular e refinada.

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