Em Boas E Mais Companhias

Vou fugir
Pra não ver que pro fundo estou desmoronando
Um futuro incerto se aproximando
E essa vida sem vida custando a passar
Por aqui
Já se esgotou a fonte de tanta alegria
Já me abraça uma nuvem de melancolia
E a certeza que não vale a pena penar
Vou fugir
Atirar minha lança num ponto futuro
E esse resto de força vai tombar os muros
Desse tempo que tanto me fez soluçar
Vou fugir
Alcançar o horizonte que ao longe me chama
Pra matar a saudade de quem não me ama
Reacender o desejo incontido de amar

Eh! Alma aventureira
Que andou pela vida inteira
Solta do meu coração
Tentando achar
A sua companheira
Tudo ilusão passageira
Desde a primeira ilusão
Eh! Alma prisioneira
Queimando em lenta fogueira
No inferno da solidão
Que ao se cortar
No espinho da roseira
Virou a porta-bandeira
Da desilusão
Eh! Alma brasileira
Tu não serás a primeira
A enlouquecer de paixão
He! Alma seresteira
Tu choras pela madeira
Do meu violão

Eu me perdi tentando te encontrar
Na liberdade te amarrei
Te dividi na ânsia de somar
Pra te ver sorrir, chorei
Pra conquistar a paz, guerreei
Com as armas da ilusão
E pra te castigar, perdoei
Botei o pé no chão
Levei o andor, nem assim rolou
Te amei mais do que a Deus e pequei
O céu me condenou
Eu fui te iluminar e me apaguei
Beijei a mão da dor
Você vazou
Foi um favor, foi um favor…

Eu não sei se a nuvem vai desabar
Sob o céu da tua realidade
Vento forte que plantaste no olhar
Trouxe chuva, fez-se tempestade
Coração deserto vira metade
Não se deixa o amor à revelia
Não se joga ao mar a pescaria
Não se impunha uma canção
Afogando a inspiração
Não se vai ao sol sem melodia
Não tem luminosidade
A luz que da maldade irradia
Bem maior do que nossa vontade
O que nasce termina
E o que chamam de felicidade
Segue com a ventania
Se o escudo da nossa verdade escondia mentiras
Foi melhor o inverno chegar e cobrir nossos dias
Por isso vou me consolar, desvendar
Ir de encontro e não difamar a vida
Ter de novo meu sol
Nuvem negra afastar
Se meu destino é reconquistar e me encantar
Por isso sou pescador, sonhador, condutor, artista
Ter a minha canção flutuando no ar
E ir se espalhar na brisa

Mas que saudade é essa que chegou
Que me abraçou e me deixou em vão
Tão discreta sem alarde
Transformou meu fim de tarde em solidão
Não traz o rosto e nem a voz de alguém
Nem mesmo a morte de uma ilusão
Só um remorso profundo que dormia lá no fundo do coração
Eu que vim de uma saudade
Que doía de verdade
Quase tirando a razão
E que ardia no meu peito
E que fazia o mesmo efeito
Que as lavas de um vulcão
Porém essa que chegou aqui
Veio assim com jeito de ficar
Se alastrando de mansinho
Me apertando num carinho
Que faz chorar

Encanto é seu
Encantado sou eu
Sou eu, sou eu, sou eu
Paixão e Lua
Lua nova, lua cheia
Água-mãe balanceia
Quando você
Vem me banhar na areia
No clarão da Estrela-Guia
O Abô me acaricia
E eu de colar vermelho
Me penteio no espelho
Da pedra dos seus anéis
Roda do tempo gira
Onda no vento vira
E cobre de conchas meus pés
Me encanta, me encanta
Com seus milagres e mistérios
Me encanta, me encanta, me encanta
Com seus milagres e mistérios me encanta

Sete e meia, a lua no céu
Quando a nuvem branca dormiu
No seu dedo pus um anel
No meu peito a vida floriu
Serenou, pintou madrugada
Uma estrela guia na estrada
E o sol que vem na virada
Abre os meus caminhos
Sete e meia, verde no mar
Quando um peixe espada fugiu
No anzol fisguei seu colar
No pescoço, como serviu!
Um pingente de Yemanjá
Quando a onda branca partiu
Os ventos assobiavam
Chuva de abril

Canta galo!
Fé! Vem lá do congado!
Pé! Deu o nosso encontro!
É! Sete e meia em ponto!
Sete e meia voltas lhe dei
Volta e meia uns laços de flor
Na hora em que os olhos plantei
Nos seus olhos, tudo brotou
Era o brilho de uma manhã
Quando a folha branca pousou
No nosso terreiro o ponteiro
Faz o que tempo parou

“Anda, retira de cima
Esse manto de medo
Abre essa mão
Que eu vou revelar um segredo
Vou, meu irmão
Ensinar beber água na fonte
Poder caminhar os caminhos do monte
Aonde amanhã
Novo sol vai nascer
É nessa vida
Ninguém foge porque tem medo
É justamente o contrário
Medrou quem fugiu
Vai, meu irmão
Rasga as folhas
Do teu samba enredo
Desvia teu barco dos velhos rochedos
Mais tarde ou mais cedo
Me darás razão”
E foi assim que me disse
A bela cigana
De brincos de ouro
De porte de dama
De vida e de morte
No fundo do olhar
Leu minha mão, me rezou
E levou meu dinheiro
Mas a tal cigana não sabe talvez
Tirou meu veleiro do fundo do mar

Tudo que esperei
De um grande amor
Era só juramento
Que o primeiro vento carregou
Outra vez tentei
Mas pouco durou
Foi um golpe de sorte
Que um vento mais forte
Derrubou
E assim de quando em quando
Eu fui amando mais
Passei por ventos brandos
Passei por temporais
E agora estou num cais
Onde há uma eterna calmaria
E eu não aguento mais
Viver em paz sem companhia

Amar, perder
Sofrer, ganhar
Água correr em sua lâmina cortar
Já derramei todos os prantos
Estive longe com meus cantos
Parar pra quê?
Recomeçar
Em terra firme como seu olhar
Cada prazer
Iluminar
Ir pela estrada, em cada pedra vou pisar
Assim eu fiz todos os anos
Fui pelos ventos, pelos planos
Fazer o quê?
Deixar levar
E solta vai a folha pelo ar
E vem chegando o dia
Seu manto azul de alegria
Amar, perder
Sofrer, ganhar
Saber viver e até saber cantar
E vem chegando a noite
Com seus sustos, seus açoites
Mas com você no coração
Eu sigo pelas asas da ilusão